Escócia

Era uma vez um país

 

Montanhas de cortar a respiracão. Castelos encantados. Mágicas ilhas verdes. Símbolos culturais únicos: Kilt, whisky, gaita de foles. Um povo excêntrico que “embriaga” com histórias multifacetadas. Deixe-se seduzir pela Escócia. Neste país fascinante, o impossível acontece.

 

“Se quiserem, podem sentar-se neste sofá ao meu lado. Não espero ninguém. Assim, podem escutar as minhas histórias. Costumam ser extraordinárias”, salienta um velho escocês. Estamos num pub perto de “Royal Mille”, uma rua simbólica do centro de Edimburgo. A voz singular do nosso novo amigo confere uma atmosfera especial a este recinto totalmente lotado. Aceitamos a sugestão sem hesitar.

A história prometida surge sem demoras: “Há muitos, muitos anos havia um navegador chamado Mackay, conhecido como o “Imbatível”. Era temido por todos. Navegou por vastos oceanos e mares; roubou ouro e pedras preciosas. Um dia descobriu a Escócia. Provou o nosso whisky, escutou os sons únicos da gaita de foles, encantou-se com a simpatia das pessoas. Por aqui deixou-se ficar até descobrir o fantástico local onde nos encontramos. Apaixonou-se por uma bela mulher e, após diversos anos de felicidade, morreu. Mas deixou a todos os escoceses este pub, um dos mais populares do país”. E acrescenta: “Ainda outro dia encontrei-me com os descendentes de Mackay. Muito simpáticos”. Divertido, dá uma golada na sua cerveja. Os seus olhos marinhos fixam-nos atentamente.
A curiosidade desenfreada vence a nossa timidez: “A sério? Encontrou os descendentes do navegador?” Como resposta obtemos uma franca gargalhada:“Acreditaram realmente na minha narrativa? Ah, ah, ah. Vê-se mesmo que não conhecem a fantasia ilimitada do povo escocês”.
O cenário que contemplamos através da janela estimula, de facto, a imaginação: Magras ruelas embelezam a antiga cidade histórica emoldurada por um tecido de nevoeiro. Mas será verdade? Possuem os escoceses uma fantasia inusitada? Lindsay Corr, responsável pelo departamento de marketing do “Scottish Storytelling Center” não tem dúvidas: “A arte de contar histórias é uma das formas artísticas mais antigas do mundo e uma parte indissociável da alma dos escoceses. Diariamente surgem novas actividades e clubes, o que confirma a sua importância no quotidiano. Esta arte incentiva a fantasia do nosso povo e ajuda a preservar a História da Escócia da maneira mais importante: Através das histórias que fizeram nascer o nosso país”.

 

“Nenhuma boa história se gasta…”

Estimulados pelos caminhos da imaginação, seguimos rumo a Glasgow. A maior cidade da Escócia é vibrante. Porta de entrada para as ilhas e Terras Altas, surpreende com belos edifícios do Século XIX, uma frenética actividade teatral, o palco de música alternativa mais famoso fora dos Estados Unidos. E lendas imortais.

“Existem muitas lendas sobre Glasgow?”, perguntamos, curiosos. O condutor do autocarro responde de imediato: “Imensas. Se quiserem conto-vos uma. É sobre o patrono da cidade, Mungo (querido), uma das figuras mais relevantes da Bretanha no final do século sexto e início do sétimo. Diz-se que o peixe e o anel do brasão de armas de Glasgow fazem referência a um dos episódios ocorridos na vida deste santo. Reza a lenda que Mungo salvou a vida de uma rainha ao descobrir um anel dentro de um peixe”. E acrescenta: “Interessante, não é verdade? Há quem desvalorize o valor das lendas, mas eu acredito nelas. Trazem felicidade e aproximam pessoas de diferentes crenças e culturas”. Uma opinião corroborada por Lindsay Corr: “Apesar da influência inegável de programas “fast-food” na nossa sociedade, a arte de contar histórias é ainda a forma mais eficaz de unir povos de diferentes origens. É algo que fazemos todos os dias quando encontramos os nossos amigos e famílias – relatamos episódios do dia que passou, contamos anedotas. O “Facebook” e o “Twitter” são indubitavelmente formas imediatas de contar histórias.” E prossegue: “Escutar vozes que nos inspiram – nada é mais mágico do que ouvir uma história contada só para uma pessoa. Sem “adereços”, livros ou manuais, deixando a sua mente “pintar”imagens”.
Segundo Lindsay Corr “existem mais de 100 contadores de histórias oficiais na Escócia; uns vêm do mundo do espectáculo e da televisão, outros têm uma formação específica nesta área. Todas as pessoas têm potencialidade para se tornarem contadores de histórias. Mas a formação é importante. O sistema de aprendizagem é muito simples – um aluno segue o dia-a-dia de um contador mais experiente. O nosso centro organiza igualmente workshops que ajudam interessados a melhorar as suas qualificações como contadores de histórias”.

 

De regresso a Edimburgo, deixamo-nos fascinar pelo charme da capital escocesa. O imponente castelo observa a cidade do alto de uma colina e dá asas à nossa fantasia. As lendas sobre a segunda atracção turística mais visitada da Escócia são inúmeras: O castelo foi, por exemplo, invadido por fantasmas a tocar gaita de foles, um tocador de tambor sem cabeça e os espíritos dos prisioneiros franceses da Guerra dos Sete Anos.
Sim, na Escócia o impossível acontece: Castelos assombrados. Fantasmas assustadores. O monstro do Lago Ness. ”O segredo de uma boa história é espicaçar a fantasia do público com imagens vivas e fazer a audiência rir ou chorar através do conflito e resolução. Lendas, histórias – há sempre tempo para escutá-las.” Não podemos estar mais de acordo com Lindsay Corr. Segundo um antigo provérbio escocês: “Nenhuma boa história se gasta por mais que a contemos”.

 

Ana Bernardo